quarta-feira, 27 de julho de 2016

Toda Mulher Negra é um Quilombo!

Fotos: Jaci Borba
 Por:[1] Rosangela Nascimento

 Pegando carona no imaginário, nas forças da natureza, nos gritos de liberdade, na bravura de Oyá, Oxum e Obá, irei tecer esta partícula de conhecimento. Com a vossa licença, eu vou forjar a história das mulheres negras.
Cuidadosamente escolho as palavras. Resiliência, Resistência, Restrito e Retaguarda. Coincidentemente, todas iniciam com “R”, letra que também é inicial do meu nome, não quero ficar de fora. Assim começo, ou digo, recomeço olhando para dentro de mim. Pois, são de nossas memórias, da alma dos nossos olhos que temos que reelaborar a nossa vida.
A relação entre as palavras escolhidas, é a soma de todos os elementos que encorajam, e fazem com que as mulheres sobressaiam da zona hostil, rebotalho e desiguais causadas pelo preconceito e o racismo.
Idealizando a partir da necessidade de cada uma, em algum momento recorreram a uma destas palavras aqui escolhidas. Direcionar o aprimoramento destas é realmente um instante único, mágico e fantástico. Cada mulher negra fortalecida proporciona para outras, subsídios práticos, gerando uma energia tão influente que empodera. É importante dizer que a “classe dominante” tira tudo, moral, saúde psicológica, emprego e qualquer oportunidade de crescimento. Nascemos designadas a pobreza, a não pensar e sonhos; jamais!
Levando em consideração que o significado de “Quilombo” neste contexto vai além de esconderijo. Penso que Quilombo é união, força, sonho, liberdade de escolhas políticas e afetivas. No formato circular onde a harmonia é frequente, é a áurea em torno do nosso corpo. É aquele sentimento de pertença independente.
Eu sinto sua dor, uma vez que elas também são minhas, estamos constantemente lutando pelo direito de sermos cidadãs. Quando tudo parece pesado e difícil, vem aquele vento forte desbravando os caminhos, Oyá, em seu processo de transformação virá búfalo para defender seus filhos. Com leveza, intuição e antenada aos detalhes, Oxum enxugar as lágrimas que brotam nos olhos e caem sobre rostos negros. Então, quando a hora é de guerrear, Obá se faz presente. Somos a natureza, a fé, o desejo de superar as dificuldades e desafios. Seguimos confiantes, desdobrando possibilidades, expandindo territórios. 


Considero que “Toda Mulher Negra é um Quilombo”, visto que, onde quer que esteja ela luta, ela grita, usa sua arma mais poderosa que vem de dentro de si. Tal qual uma verdadeira heroína, corrobora com a construção da identidade, seja individual, ou grupal. Ligadas à memória ancestral, emanando um enérgico poder, que fortalece a vida de cada ser. Promovendo essa solidez particular. Todas as mulheres negras, de uma forma destravancada e dinâmica, transformam-se em um Quilombo. Deste modo, espera-se que sigam sem medo, sendo encorajadas e encorajando para driblar as mazelas sociais.
Com base, em experiências individuais e coletivas, podemos afirmar que somos um Quilombo. Quando de forma abrupta nossos ancestrais foram retirados da África. Mulheres com seus filhos, filhas nos braços, jogavam-se ao mar, negando a condição humilhante e desumana, a vergonha chamada escravidão. No tempo em que a Rainha Nzinga assume e lidera seu povo travando uma batalha pela liberdade. Na época que Dandara e Aqualtune com noções, estratégias e sabedorias ao lado de Zumbir fortaleceram Palmares. A Luiza Mahin organizou a revolta dos Malê. E a Tereza de Benguela liderou o Quilombo Quariterê. Sem se esquecer das mulheres que saem de uma condição miserável repleta de marcas das violências históricas. Não apenas foram resilientes e resistentes. Mas, recolheram-se restritamente, fortaleceram a retaguarda para emergir e vomitar algo inesperado e poderoso. É justamente esse fenômeno que vai além do que é comum que faz das mulheres negras, fortaleza inexorável.
Viver é sinal de parir, de dar à luz a algo novo. E isto nós, mulheres negras, sabemos fazer. Eu sou um Quilombo. Nós Mulheres Negras somos Quilombo. 

Ubuntu!    



[1] Mãe, Companheira, Mulher, Negra, Pernambucana, Nordestina. Blogueira, Graduada em Letras - FACHO (Faculdade de Ciências Humanas de Olinda), Arte Educadora Socioambiental. Educadora com formação em Direitos Humanos. Como escritora convidada participou - Cadernos Negros volume nº 38 dedicado aos contos (Quilombhoje).

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